28 de março de 2006

Efeito Falcão


Tássia Novaes, do A Tarde On Line

"Se ferrou Zureta, fotografaram você, corre senão os "hómi" [gíria que se refere aos policiais] te pegam". Ao perceber a presença da reportagem do A Tarde On Line, Zureta não pensou duas vezes: em segundos, correu para o outro lado da rua sem olhar para trás. Em seguida, outros dois garotos que saíam do bueiro recuaram e ficaram escondidos por mais de uma hora. O esconderijo é utilizado para fumar crack. O cenário descrito acima é o de uma boca-de-fumo camuflada em um bueiro na rampa do Mercado Modelo.

A reportagem circulou pelo Comércio e Centro Histórico nesta segunda-feira e constatou que dezenas de garotos e garotas que vivem nas ruas consomem crack à luz do dia. "Todo dia é esse entra-e-sai. As meninas também descem para o bueiro", revela um taxista que faz ponto na região da Conceição da Praia. "Algumas pessoas passam e dão dinheiro. Não é nem para comida. Serve apenas para comprar crack", diz o funcionário de um posto de gasolina que falou à reportagem sob a condição de não ser identificado.

Enquanto centenas de pessoas passam apressadas a caminho das compras ou do trabalho, há um outro fluxo que muda de sentido entre os becos, debaixo de marquises ou até mesmo dentro de bueiros. Garotos franzinos, de baixa estatura, com idade entre nove e 14 anos, seguem na contramão da legalidade e sustentam a vida sem família e sem casa para morar com o consumo de crack.

As pedras de crack são vendidas em becos no Pelourinho e em vielas no Comércio por R$ 5. A droga é consumida e negociada a qualquer hora do dia. Na rua 28 de Setembro, é possível observar garotos que circulam em busca dos fornecedores da droga ? os aviões. O movimento é discreto. Encostado em um poste, o fornecedor é abordado por um menor de idade. Trocam um rápido diálogo. O garoto entrega o dinheiro e recebe uma trouxinha enrolada em papel alumínio. Daí desce para o esconderijo, onde encontra outros companheiros de rua para fumar crack.

Bastante consumido por garotos e garotas que moram na rua, o crack é uma variação potencializada da cocaína. "É uma mistura da pasta de cocaína não refinada com bicarbonato de sódio". Funciona como se fosse capaz de deixar os garotos mais corajosos, mais agressivos e com menos temor. Condição que os impulsiona a cometer pequenos furtos, comuns nos grandes centros urbanos, conhecidos como "bater carteira". "O crack afasta a sensação de cansaço. Os usuários têm comportamento violento, são facilmente irritáveis. O uso contínuo provoca depressão forte, insônia, perda de peso e desnutrição."

A droga é consumida em cachimbos improvisados com pedaços de latas ou garrafas plásticas e pequenos tubos que funcionam como canudo por onde a fumaça é inalada após a pedra ser queimada. "O efeito não dura mais que 15 minutos", explica Calini.