17 de março de 2006

Google já monitora orkut, dizem especialistas



Tássia Novaes, do A Tarde On Line

Imagine uma época em que os livros representam uma ameaça ao sistema, em uma sociedade onde eles são absolutamente proibidos e para exterminá-los basta chamar os bombeiros. As casas têm televisores que ocupam paredes inteiras para monitorar famílias 24 horas. Esse é o cenário do clássico "Fahreinheit 451", de Ray Bradbury, de 1953. Trinta e sete anos depois, surge a world wide web com a promessa de democratizar a internet. Mas depois dos atentados ocorridos contra os Estados Unidos em setembro de 2001, a idéia de uma sociedade democrática começou a ruir.

Agora não são livros que ameaçam o sistema, mas informações que circulam no mundo virtual e se desdobram na vida real. Começou com a aprovação sem debates da Lei USA Patriot em 2001, logo após os ataques aos EUA, que permite ao governo George W. Bush espionar tudo o que os usuários fazem quando estão conectados sem que eles saibam. Quem protestar publicamente por essas ações policiais invasoras pode ser detido.

No Brasil, a situação é diferente. A quebra de sigilo virtual apenas é permitida com ordem judicial. "Caso contrário é considerado prova ilícita por ser uma ação inconstitucional", explica Rony Vaizof, advogado e especialista em Direito Eletrônico e de Informática. No início do ano, a Google foi censurada por bloquear palavras politicamente incorretas em seu sistema de busca na China e a Yahoo! foi acusada de ajudar o governo chinês a prender um criminoso. Mesmo contrariando sua defesa por um livre fluxo de informações, a Google se dispôs a fazer concessões.

O sacrifício se justifica pelo tamanho do mercado chinês, o segundo maior do mundo, com 111 milhões de internautas. Yahoo! e Microsoft também bloquearam acesso a termos como a independência de Taiwan e o movimento espiritual Falun Gong [cujas práticas têm imensa popularidade na China, mas foram proibidas em 1999].

Terra de ninguém - Recentemente, a Google se viu diante de um outro dilema: o orkut, que foi criado há dois anos com a ambição de se tornar a maior rede de relacionamentos do planeta, cresceu rapidamente e se transformou em uma cidade virtual onde mocinhos e bandidos convivem diariamente com menores de idade. Apesar de a empresa aceitar imposições para impedir acesso a palavras politicamente incorretas e ajudar a prender criminosos, no orkut conteúdos que vão de pornografia, apologia a drogas, incitação à violência e ao racismo estão disponíveis a pessoas de todas idades nas páginas que abrigam mais de sete milhões de brasileiros ou 72,3% dos membros da comunidade.

Como sair dessa enrascada? Essa é a pergunta que mais atormenta os criadores do site. A Google pode monitorar tudo o que acontece no orkut? Por conta de denúncias feitas pelo A Tarde On Line, terá de fornecer à Justiça informações de supostos criminosos que usam a rede para praticar pedofilia, xenofobia e racismo. O Ministério Público Federal pediu à Justiça Federal a quebra de sigilos de informática de centenas de usuários brasileiros do serviço de redes sociais orkut.

A empresa chegou a anunciar que iria estudar uma forma de filtrar o conteúdo que circula na rede, mas não foi esclarecido de que forma essas páginas serão monitoradas. Atualmente, o usuário que quiser denunciar irregularidades pode fazê-lo anonimamente por meio de um link na página da própria comunidade chamado "Falso! Denunciar". A ironia é que dentro do próprio orkut existem usuários que, uma vez banidos do sistema, formam comunidades que explicam como driblar as restrições.

Impunidade - Até agora nenhum filtro foi criado, e as páginas consideradas ilegais ou imorais continuam no ar. Pesquisa feita nesta quinta-feira com palavras-chave "sexo salvador" e "lança-perfume" mostra que a impunidade é flagrante na rede. Há 55 comunidades referentes a sexo e 83 relacionadas a drogas.

Especialistas ouvidos pelo A Tarde On Line dizem que a Google monitora esses usuários e poderia expulsá-los do site, mas não o faz por interesses comerciais. "É possível e provavelmente já é feito, afinal é do interesse comercial da empresa criar o padrão de uso dos participantes", explica Ricardo Bittencourt, engenheiro de telecomunições da Politécnica Universidade de São Paulo (USP).

O modelo de negócio da Google é baseado principalmente na análise da seqüência de padrão de cliques para obter a receita milionária da empresa que fechou 2005 com faturamento de US$ 6 bilhões e a colocou entre uma das empresas mais valorizadas, tendo batido a marca dos US$ 100 bilhões na bolsa. A sequência de cliques procura seguir a pista do histórico de navegação do usuário.

A companhia já é maior que a Time Warner, a Coca-Cola e a GM. Noventa e nove porcento da receita da Google provém de um anúncio de 12 palavras, o link patrocinado. Trata-se de um tipo de publicidade associado às pesquisas feitas na internet, se o internauta clicar em um anúncio pago, o anunciante desembolsa pela publicidade. "O Google tem o registro dos vínculos existentes entre os perfis dos usuários, sendo possível mapear as redes criminosas e identificar autores dos crimes", reforça Thiago Tavares de Oliveira, presidente da ONG Safer Net. "É complexo, mas é viável. Não é um processo simples, mas pode ser feito", reforça Richard Assis, coordenador de tecnologia do Comitê para Democratização da Internet (CDI).

Um comentário:

Anônimo disse...

o que eu estava procurando, obrigado