2 de fevereiro de 2007

Ben Harper

Algumas pautas são de doer o estômago. Nessa de viver infiltrada em duas indentidades - ora como fotógrafa, ora como repórter tenho notado algumas diferenças cruciais nas duas atuações. É que repórter se perder a cena pode pescar tudo do coleguinha que estiver do lado. Mas e o fotógrafo? Se perder a cena, faz o quê???
Ben Harper no aeroporto, por exemplo. Dribla engarrafamento, corre pra lá, volta pra cá, pergunta a um, a outro. Ninguém responde. Ninguém viu, ninguém sabe. Vôo? Horário? A única certeza era o local de embarque: Rio de Janeiro. Pergunto a Infraero: nada. A faxineira: nada. Procuro coleguinhas de outras mídias: nem sinal. Apelo pra central de atendimento: balcão às moscas. Só resta pensar: putz, me ferrei! Daí a redação começa a ligar a cada cinco minutos: cadê o cara? Como não chegou? Dê um jeito ai. Temos um buraco na primeira página. Acho bom você arranjar logo uma foto desse surfista. Parêntese: a duas horas do fechamento da edição, o termo "acho bom você dar um jeito" é uma forma educada de dizer: se você não conseguir, sua cabeça vai rolar. Nem se engane que o eufemismo não é nem de longe um conselho e sim uma ordem que deve ser executada. Nesse momento, após encarar duas noitadas internada no Festival de Verão (lembrando que ainda restavam outras duas), a base de junkie food e deadlines sufocantes pra cumprir, é praticamente inevitável não bater a famosa caruara. A cada pico de nervoso, o estômago apitava. Até que sem esperar, ouço um sussuro no pé de ouvido: "Oi. Cê tá atrás do Ben? Uma amiga minha tá no mesmo vôo que ele. Era pra chegar às 20h, mas vai atrasar mais de uma hora", despacha um sujeito anônimo. Será?, penso. E antes mesmo de rebater com uma outra pergunta o sujeito some entre os passageiros. Espero, espero, espero... e nada! Até que na escala de vôos aparece um vôo da Gol vindo do RJ. É minha última chance só pode ser esse, falo pra mim mesma. Desce cachorro, gato, papagaio, piriquito... olho ao redor: ué? Cadê a tv Bahia??? Ai ai aiiiii... é zebra. A tv Bahia deve tá fazendo exclusiva com a cara lá nos fundos, onde só eles têm acesso, que nem na vez do U2, especulo na paranóia de a essa hora já ter levado um puta furo. Mas... que jeito! Tô aqui, vou até o fim só pra ver quem foi o infeliz que fez a bendita imagem que, de alguma forma, vale o meu emprego [foda!]. O segurança dá uma brecha, daí eu passo de fininho pro setor das malas. De lá, fico abaixadinha, bem na espreita, esperando o cara que não vem nunca. E, de repente, como uma luz que aponta no fim do túnel, vejo um morenaço, de chapeuzinho de couro. POr causa das tatuagens a mostra, imposível de confundir. Aponto a máquina e disparo uma seqüência de cliques até ser barrada pelo produtor: quem deixou essa pessoa entrar aqui? Tenho contrato exclusivo com a Rede Globo, não pode. Gesticulou aos berros. Mas antes que qualquer segurança me puxasse a força, Ben Harper, o cara que tanto esperei chegar, veio saber o que estava acontecendo. E, para minha surpresa, o cantor-surfista [autor de um som que eu me amarro horrores], gentilmente permitiu que as imagens fossem feitas. Daí já tinha até berimbau no saguão de desembarque pra receber o rapaz. Fotos, fotos, fotos, muitas fotos. Um cartão inteiro só dele e sem concorrentes por perto. De recompensa, um singelo "ok" da redação acompanhado de uma puta dor de estômago que só cessou depois da coletiva com D2 horas depois no Parque de Exposições.
Fotos a parte, talvez esse seja o tipo de pauta que mais pira minha cabeça. Ao contrário do que muitos pensam, é constrangedor sim [e muito!] enfiar a lente na cara de uma pessoa sem a prévia permissão. E quando a pauta surge na redação a primeira coisa que penso é: não dá pra ser outro fotógrafo, não?!?!
A questão é que esse constragimento dura pouco mais de um segundo. Tempo suficiente para Tássia, versão fotógrafa [aquela que aparece sempre que a máquina está em punho], tomar o espaço de Tássia, aquela que é apenas um hiato crescente acentuado na primeira sílaba, aquela que não dispensa uma praia com os amigos nem uma partida de sinuca nem uma boa cerveja gelada. Essa versão [original] se contentaria em assistir o show espremidinha ao lado de outros milhares de fãs com a diferença que no dia seguinte seguinte já teria passado pro iPod o set list do show pra ir ouvindo a caminho do trampo.
POis... acreditem... fotografar, pra mim, chegar ser um estado de espírito além da realidade que ocupo como mera cidadã. O foco principal é o compromisso de fazer. Mas isso é um outro assunto [longo, diga-se de passagem] e merece ser discutido em um outro post.
É isso, curtam aí, Ben Harper exclusivo pra vocês.



2 comentários:

Anônimo disse...

Adorei saber da sua aventura em busca do Ben H. Com essa disposição cuidado pra não te mandarem cobrir uma guerra! kkk
Se for o caso eu vou com vc de (como é mesmo?) papagaio?!
Grande beijo,
Murilo

tássia disse...

Vc, Murilo, por aqui... (?)
Que surpresa!
Um beijo e volte outras vezes :)