11 de dezembro de 2007

Festival 5 minutos - 1ª noite

Meus dedos coçam para tecer comentários sobre os curtas exibidos na estréia do XI Festival Nacional de Vídeo Imagem em 5 Minutos. Atitude um tanto suspeita quando se tem um filho entre os selecionados. Até cogitei ficar na espreita, aguardando o veredicto final, mas... vamos lá. Adianto que o espaço não é muito democrático. Se está a procura de críticas isentas, com análises técnicas, sugiro leitura de um blog ou site especializado em cinema que esteja cobrindo o festival. Por aqui vão circular comentários baseados nas tendências e preferências da autora. Pois então, a noite:

Expectativa generalizada. Dava pra perceber no burburinho que rondava o foyer da sala Walter antes de começar a mostra competitiva. 50 selecionados. Alguns mil reais em prêmios. Toda estréia amarga a euforia de desconhecer o que está por vir. E por lá passaram bons curtas no telão. COm direito a platéia reagindo ao final de cada projeção. Cheiro de prêmio no ar.

Vou começar pelo mais aplaudido - As fitas malditas do padre Pinto (BA), de Daniel e Diego Lisboa. O vídeo é algo. Impactante. Mas como não? É padre Pinto com o colhão de fora, rosto pintado, guias no pescoço e uma lata de cerveja na mão. Precisa de algo mais pra causar uma reação eufórica nas pessoas? Pois não pára por aí. Uma sucessão de palavrões ao falar sobre a infância, o carnaval e a vida no seminário. Coisas do tipo: pergunta o diretor - Como foi a sua infância? "Podre. Chupei a rôla do meu pai. Uma rôla linda". Ou então: "Quinta-feira mulheres chupam buceta (...) sexta-feira santa viado come cú". É por aí que vídeo segue. A reação da platéia me fez lembrar o Império do Grotesco, de Muniz Sodré. Satisfação ao ver a estética da cintura para baixo, que é também a estética do carnaval, dos jogos populares, do circo, da feira. Diferente do juízo de gosto voltado para o sublime, para o homem da cintura para cima, o olhar para o céu. O grotesco não quer a elevação. É o contrário do barroco. Funciona por catástrofe, um escândalo que motiva risadas, mesmo que seja uma risada distorcida e nervosa. Questiono a validade desse tipo de estética. De qualquer forma, é festival e de tudo é bem-vindo. Cabe a cada espectador fazer a sua aposta. Essa definitivamente não é a minha. Até mesmo porque é a contra-mão de A Mina de um povo (BA), o nosso rebento. Ouso compará-los pelo fato de serem da mesma categoria - documentário. A mina... tem pé na atualidade, traz um pedaço da Bolívia de Evo Morales com destaque para a extração de minério, um dos pilares da economia boliviana. Viés sócio-político. Feito por jornalistas que buscam fugir da cobertura da América Latina feita pela grande mídia. Detalhes do curta aqui. Além do propósito diferenciado, A mina... brinca com a linguagem cinematográfica. Estética bem apurada, ritmo na troca de planos. Cores e áudio bem definidos.

Na verdade, os documentários reinaram na estréia do festival. O primeiro a ser exibido, 500 mil volts (RJ), sobre os homens que fazem a manuntenção dos cabos de energia. Fotografia no padrão Globo de jornalismo. Todo bem enquadrado, certinho. Narração em off. Me parece que faltou um pouco de pimenta na edição para passar com mais afinco a idéia de que o serviço é de alto risco. Algo que tirasse o fôlego de quem assiste. Será? Talvez seja isso.
Gosto de A infância de Anastácia (BA). Outro doc. Só que biográfico. O vídeo é exatamente o que diz o título. A memória de dona Anastácia, contando os tempos de quando era menina. Senhora simpática, arrancou simpatia da platéia. Traz imagens interessantes de aquivo, do cinema de Leon Rozemberg, anos 50, se não me engano.

Mais doc: A marcha (BA), sobre uma marcha de mais de três mil integrantes do MST, estrada a fora rumo a Salvador. Imagens bacanas, mas... delize fatal no off. Texto com metáforas, com destaque para elementos subjetivos. Tentativa de fazer algo artístico, mas termina sendo redundante e pouco poético. Banquete (BA). Etnográfico. Membros de uma tribo em Moçambique dissecam um elefante. É legal porque é sempre bom ver um pouco de outro país, outra cultura, outros rostos. E a África é muito fotográfica. Porém, ao espectador, sobram perguntas no ar: trata-se de uma tradição local? Mataram o bicho por maldade ou apareceu morto e resolveram aproveitar a carne? Contexto pouco abordado, acaba deixando a narrativa perdida. Berengudê e a panela de pressão (BA), esse tá no estilo vídeo-reportagem. Um microfone de programa de tv aparece junto com cada entrevistado. É sobre uma rádio poste no Garcia. História curiosa, personagens bem humorados. Peca na edição. Parece trabalho de faculdade feito as pressas no final do semestre. Precisa mais requinte para concorrer a prêmio. E o último doc: Berço esplêndido (BA). O clichê. Sobre catadores de rua. Muito vitimizado. Os pobres coitados excluídos da sociedade capitalista, consumista, ó monstro abominável. Hino nacional tocando ao fundo. Menos, né? Foi-se o tempo em que esse discurso convência. A realidade é um pouco mais além. Lembro de uma matéria que fiz no início do ano com Vítor Pamplona. A Prefeitura construiu umas casas para abrigar moradores de rua. Dois quartos, cozinha, banheiro, tudo zero bala. Seriam os primeiros donos. Forneceu ajuda financeira, uma espécie de mesada. Fomos lá fazer matéria. Não pra mostrar a boa ação da prefeitura. Mas porque a assistente social estava desesperada: eles preferiam continuar na rua. Antes de vitimizar, não dá pra esquecer que há excessões. Nem sempre mendigância está relacionada a exclusão social. Passa pelos confins sombrios do psíquico também.
E finalmente as ficções: Bar (BA), Batateogonia (SP) e Bolachinha de goma (BA). O curta paulista foi "o" filme da noite. Engraçadíssimo. Muito bem bolado. Bem editado - uma mistura de vídeo, fotografia digital, colagens. Não sei de onde brotou tanta criatividade para traçar a criação do universo com o Gênesis e a tecnologia, sendo a deusa geradora de todos nós a Elma Chips. Só vendo pra crer, é diversão garantida. Bar é um vídeo perdido. Não mostra pra que veio. Bolachicha de goma tem trilha muito altro astral, embora a história seja também fraquinha, fraquinha.

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