30 de abril de 2008

Feito moldura no vidro

Avenida Talatona, esses dias

Da janela do carro, vejo cenas incríveis todo dia a caminho do trabalho. Os miúdos estão sempre correndo. Passam ligeiro, saltidando, estilo biribano... mal consigo ver o rosto. A maioria vai descalço. Pé na lama, no lixo, no caco de vidro. Os que ainda são nenêm vão na garupa da mãe amarrados por um tecido nas costas. [Me lembra as andinas, outro dia ali na Bolívia]

Avenida Rocha Pinto, semana passada

As mulheres são atração a parte. Postura impecável de quem desfila na passarela. Cervical feito régua em 90º graus, passo firme, carne rígida com balançar sutil apenas no quadril zero-estria, zero-celulite. Seguem em passo médio - mais lento que os miúdos, mais rápido que os cotas (velhos) - com coisas e coisas perfeitamente equilibradas na cabeça. Butija de gás, cesto de pão, lata d'água, quilos de verdura, quilos de fruta, pedaço de madeira, móvel, eletrodoméstico ou qualquer outro cacareco. Tudo vai na cabeça. Peso suficiente pra desbancar qualquer homem.

Tem uma cena - ainda não fotografei - que faz parte do cotidiano aqui em Luanda, é o seguinte: dois homens para carregar um único butijão de gás, um de cada lado, em nítido sinal de esforço. Não demora cinco segundos passa uma mulher, logo atrás, com o mesmo butijão equilibrado na cabeça, sem auxílio das mãos e a cara tipo nada, como se diz por aqui. As mãos também vão ocupadas, no mínimo, com uma trouxa. Isso quando o filho não tá ali, grudadinho nas costas. Força como nunca tinha visto antes. Aliás, mais do que isso. Parece filme. Mas é vida. Se bem que há quem diga que a arte imita a vida. Quer dizer, Oscar Wilde diz exatamente o oposto em Pen, Pencil and Poison: "A vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida". Será? Sei lá. Esse debate deixo pra outro dia.

3 comentários:

Anônimo disse...

que lindo esse blog voltar a existir. vou vir sempre acompanhar as suas andanças. vejo que luanda te inspira.
beijos. saudade de quando vc estava logo ali, e a gente podia trocar maledicências pela abelhinha.

katherine funke disse...

Tássia, adorei achar seu blog, por acaso, assim. Você tem muita sensibilidade, escreve e fotografa bem para caramba. Aproveita tudo que a vida está oferecendo, sempre em paz. Valeu!

tássia disse...

ÔôÔÔô, Katherine =)
Que surpresa sua visita, volte mais vezes, pra interagir.

Tati, em bom baianês: vc não ia se dar em Luanda, rsrsrss.