8 de dezembro de 2008

Um dia diferente

Chove forte lá fora. Quase não consigo enxergar os prédios altos que limitam o horizonte. Uma camada cinza, suspensa no ar, como se fosse uma cortina, atrapalha a visão. Tem vento, mas não está frio. Alguns pontos da cidade devem estar alagados. Normal. Estou sem sono, mas não tenho pressa em levantar da cama. Passa do meio-dia. Ainda não escovei os dentes, sinto gosto de vida na minha saliva. Não tenho horário, não tenho que ir trabalhar. Inédito.

Poderia ser mais um dia de chuva qualquer: trânsito lento, a barra da minha calça ensopada, meu humor prejudicado, sombrinhas virando ao vento. E se assim fosse, não estaria aqui sentada bocejando essas linhas descompromissadas. Hoje tudo está diferente. Não preciso falar com a atendente da Codesal. Não preciso calçar galochas para sair em busca de desabrigados. Não vou consultar a previsão do tempo nem São Pedro será incomodado. O único compromisso do dia vem de mim para mim mesma. Sinto um conforto inabalável. Posso passar o dia de pijama andando de meia pela casa. E sem culpa: não estou desempregada. É o meu primeiro feriado nos últimos cinco anos. E caiu justo numa segunda-feira, pra prolongar a satisfação. Planejei ir à praia - nadar, ler um livro, me espalhar na areia. Meu programa predileto para um dia de descanso. De repente, abro o olho, o céu desaba em água, mudo os planos, e, ainda sim, há satisfação. O edredon aquece um romance na minha pele. Pra que levantar? Posso me esticar, rolar de uma ponta a outra. O colchão não está frio, sinto uma respiração na minha nuca. Há vida ao meu lado.

Que fique aqui registrado, para jamais ser esquecido. Hoje, 8 de dezembro. Dia de Nossa Senhora da Conceição, padroeira de Salvador e de Santa Maria. Talvez essa sincronia traga um pouco de explicação à minha intensa relação com os que vêm dessa cidade gaúcha. No meu calendário puxei um asterisco. Agora a data pode ser lida como a vez que voltei a gostar dos dias de chuva.

6 comentários:

Ana Bittencourt disse...

que querida... ela tá longe, mas a gente continua presente nos pensamentos... quem sabe isso seja vontade de voltar? a gente ficaria bem feliz!

LC disse...

simplesmente: uma delícia!!!

Dorotéia Sant'Anna disse...

um primor esse texto!!! que tb a vivência seja assim, de nível! rsrs

Dorotéia Sant'Anna disse...

um primor esse texto!!! que tb a vivência seja assim, de nível! rsrs

Dorotéia Sant'Anna disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Bruna Hercog disse...

Êa!!! você merece!